Pergunta
(Radyr Gonçalves)
Com
o advento da Internet, a poesia, assim como a música e outras artes, ganharam
um espaço grande nas redes sociais. Como o poeta vê a poesia contemporânea
divulgada na rede? A poesia Fast Food é a poesia da vez, a poesia que vende, a
poesia de mercado? O poeta acredita, que assim como acontece com os hits
musicais, esse tipo de poesia é apenas uma onda passageira?
Resposta (João
Andrade)
Eu
acredito que o homem é a medida de todas as coisas. A Internet é um instrumento
que pode ser usado para todas as finalidades. Antes dela já havia manifestações
artísticas descartáveis. A Internet só possibilitou uma maior divulgação desse
material. Fenômeno que já ocorreu com o rádio e a televisão. Creio que a história determina separando o
joio do trigo e quem tem o que dizer termina sendo ouvido, mesmo depois de
morto. O que importa ser reverenciado é a arte, não o artista.
Pergunta
(Mizael Souza)
Quem
decide o que é e o que não é descartável quando o assunto é algo tão livre como
a arte e em especial a poesia? O que de fato pode ser chamado de poema?
Resposta (João
Andrade)
Como
literatura é a arte da palavra, o que define o que é descartável ou não é
aquilo que, baseado em teoria literária, é definido como possuidor de recursos
poéticos de forma e conteúdo como relevantes ou não. Poema é a concretização
física da poesia. Se esse poema é bom, ruim ou descartável é outra discussão.
Pergunta
(Adélia Costa)
João,
as suas imagens poéticas são digamos "dark", construções como anjos
tísicos, caos, ser ferido, abismos, vazio, são recorrentes em seus poemas,
tanto que as ilustrações são imagens mais escuras, sombrias. É perceptível o contraste
entre elas e as suas telas cheias de cores, as suas postagens com tantos verdes
e cores no Facebook, de plantas, dentre outras. Considero tudo isso como um
fazer poético em diferentes campos. Pergunta: você intercala seu fazer ou até
sentir poético mais "pesados" com essas outras produções que a meu
ver são tão leves, cheias de cores, alegres?
Minha
amiga Adélia,
Resposta (João
Andrade)
O
João Andrade que pinta, gosta de jardinagem, paisagens bucólicas e até dá aulas,
é um personagem. É uma invenção minha. Ele não é real.
Pergunta
(Ozany Gomes)
João,
quando Thiago Gonzaga, te perguntou em uma entrevista, “Quem é o poeta João
Andrade?” Você respondeu:
“Sou
uma criatura em constante conflito, tudo, em mim, têm várias possibilidades,
tudo é estilhaço, tudo é incompleto. Jamais chegarei a ser Cecília.
Nesse
desequilíbrio, um dia olhei para dentro de mim e vi um abismo, pulei. Ainda
estou em queda. Nesse transcurso, procuro me avaliar constantemente, para que
eu possa ir vencendo meus demônios diários e, hoje, eu possa ser melhor do que
fui ontem.”
Essa
resposta foi dada há três anos... mudou alguma coisa nesse conceito a seu
respeito?
Resposta (João
Andrade)
O
que mudou, minha amiga Ozany, é que três anos depois estou cada vez mais perto
do fundo do abismo e amando mais ainda os momentos do transcurso da queda.
Pergunta
(Adélia Costa)
Por
que Livro de Palavra se há muito mais lá?
Resposta (João
Andrade)
Porque
participei de um concurso de poesia e coloquei os poemas em parágrafos. Foi
devolvido alegando que não era um concurso de prosa. Então quando me perguntam:
seu livro é de que? De palavra.
Também
pela ambiguidade de que alguém de palavra é aquele que cumpre o que diz.
Pergunta
(Adélia)
Percebemos
algumas aliterações. Elas foram trabalhadas ou fruto da inspiração direta?
Resposta (João
Andrade)
Normalmente
ocorrem na inspiração. De algum modo já construo o verso assim.
Comentário
(Geralda Efigênia)
Graça
e paz e mais inspirações, sua poética inspira e conspira, artista.
Pergunta
(Radyr Gonçalves)
João,
esses abismos de que tanta fala não seria uma busca espiritual por algo mais
profundo, além do que a religião nos proporciona?
Resposta (João
Andrade)
Poeta
Radyr, acredito que sim. Não sou religioso, mas sou constantemente encantado e
espantado com o mistério e o espetáculo da existência.
Pergunta
(Radyr Gonçalves)
Deus
seria um poema desconhecido e misterioso nessa busca?
Resposta (João
Andrade)
Não.
Deus seria o poeta. Poesia é o estado d'alma que pode se concretizar em
diferentes formas artísticas: pintura, fotografia, música, balé, etc. Quando a
poesia se concretiza através da palavra escrita ou oral é um poema.
Pergunta (Ivam
Pinheiro)
A
intertextual idade é como um gatilho que detona a inspiração. Na sua poesia,
seja escrita ou visual, nas imagens dos belos quadros, na minha opinião, é
possível ver as duas vertentes das palavras que o dominam e conversam com o ser
poeta.
O
forte traço, as vezes, mais triste ou real do cenário do mundo nos poemas
escritos, e o quase bucólico traço de estética sonhadora na pintura.
Você
identifica nestas vertentes, o que te influencia, seja de forma intertextual ou
através do inconsciente da poesia adquirida por ti?
Resposta (João
Andrade)
Ivam,
a intextualidade, em mim, não desencadeia uma inspiração. Ela é apenas um
recurso literário q às vezes utilizo na intenção de dialogar com um texto
consagrado e assim transmitir de forma satisfatória o q desejo.
Eu
sofro influência de tudo e de todos. Sou uma antena.
Comentário
(Eliete Marry)
Perfeito:
A poesia é estado de alma, é tão provado a afirmação do João, que não
conseguimos escrever poesias somente quando queremos, mas quando a alma deseja.
Quando estamos em estado de alma. Eliete Marry
Há
muita gente q sente esse estado d'alma, até adoece de "poetite", mas
não consegue transformar esse estado em poema. Então encontra um poeta q fale
por ela.
Pergunta
(Adélia Costa)
Você
trabalha os seus poemas em sala de aula?
Resposta (João
Andrade)
Não.
Não trabalho.
Pergunta (Ivam
Pinheiro)
João
Andrade, seus quadros fazem referência a sua poesia? Quais as suas influências
na pintura?
Resposta (João
Andrade)
Ivam,
meus quadros são formas de expressão literárias que não consegui dizer em
palavras, talvez por eles serem coloridos e eu plúmbeo.
Quanto
às influências na pintura, não sei precisar, pois gosto de tudo.
Pergunta (Rita
Cruz)
João
admiro seu trabalho. Mas eu gostaria de saber se o que você escreve tem algo
relacionado a sua pessoa? Suas poesias abrangem sentimentos que não são seus?
Já que dizem que o poeta é um fingidor... gostaria de saber sobre o seu eu
poético.
Resposta (João
Andrade)
Minha
querida Ritinha, apesar de procurar cantar de forma universal, ou seja, falar
do sentimento de modo que todo ser humano possa se identificar com ele, tudo que
escrevo é autobiográfico.
Pergunta
(Adélia Costa)
Dos
poetas do Rio Grande do Norte, quais te influenciaram e se tem um em específico
para citar.
Resposta (João
Andrade)
Amiga
Adélia, há uma deficiência em minha formação no que diz respeito à literatura
do RN. Deficiência que estou procurando diminuir depois do contato com o Thiago
Gonzaga e com os poetas amigos da SPVA/RN.
Posso ressaltar apenas os mais conhecidos como Jorge Fernandes, Luiz
Carlos Guimarães, Zila Mamede e Auta de Sousa.
Tenho
também tido acesso aos trabalhos dos poetas contemporâneos. Quanto à influência
confesso que não sei precisar.
Pergunta
(Adélia Costa)
Sendo
você artista plástico, não pensa em também produzir poesias visuais?
Resposta (João
Andrade)
Adélia,
para mim toda poesia é visual, assim como é tátil, olfativa, gustativa e
sonoro, de modo que se faço poesia, já a faço visual.
Pergunta
(Paulo Caldas Neto)
João,
quais das correntes de vanguarda estariam mais presentes na sua pintura?
Resposta (João
Andrade)
O
dadaísmo e o surrealismo apenas como referências, não como estilo. Como estilo,
eu não sei classificar o que eu pinto. Eu não entendo nada de pintura. Eu sou
um engano das artes plásticas.
Pergunta
(Paulo Caldas Neto)
O
que representa a Filosofia enquanto ciência para você, João? E para a sua
poesia?
Resposta (João
Andrade)
A
Filosofia para mim, Paulo, é o instrumento em que busco respostas para minha
inquietação de existir e que possa me servir como base para o que eu tento
transmitir em minha arte.
Pergunta
(Mizael Souza)
Onde
nasce a sua poesia?
Resposta (João
Andrade)
Creio
que a minha poesia é a poesia de todos os seres humano e dessa forma ela não
nasce, de algum modo ela existe de todo o sempre. Em mim, essa poesia se
faz poema sempre que o existir me fere.
Pergunta
(Adélia Costa)
O
existir te fere quando ele te deixa feliz?
Quando vê um poema criando vida? Acho q suas pinturas têm muito dos
vitrais, das dobras tão ensinadas e estudadas pelo professor Ivan.
Resposta (João
Andrade)
Sim.
Gostei da sua conceituação Adélia.
Comentário (Josivan
Alves)
João,
gosto de sua poesia porque não tem essas besteiras de palavras difíceis, a
gente lê e entende, é limpa e arrebatadora. Existem poetas que escrevem coisas
que só eles entendem e o leitor fica perdido.
Comentário (Mizael
Souza)
Quintana
dizia que quando o leitor não entende um poema, o leitor ou o poeta é burro.
Pergunta
(Paulo Caldas Neto)
Você
acha que outros poetas do RN têm em você um referencial para escreverem poemas,
como é o caso de Leocy Saraiva, porque existe uma relação poética muito forte
entre vocês dois?
Resposta (João
Andrade)
Eu
não tenho condição de ti responder isso Paulo. No caso de Leocy, acredito que
nossa convivência e estudo em comum têm sido benéfico aos dois e nos
influenciamos mutuamente.
Pergunta (Zé
Martins)
João
Andrade, meu irmão, boa noite! Eu estou querendo saber o que é ser poeta? O que
é ser artista? E quando você assumiu, publicamente, ser poeta, ser artista?
Resposta (João
Andrade)
Ser
poeta, ser artista é ter o olhar voltado simultaneamente para o infinito e para
as entrelinhas da vida e ter a obrigação de transmitir, através de sua arte, o
que enxerga para o próximo. Caro Zé, eu não assumi.
Comentário (Zé
Martins)
Nós
nos sentimos muito bem em ter você como um grande poeta/artista, e assumimos
tal posicionamento no primeiro encontro com você e sua arte poética.
Pergunta
(Roberto Noir)
João,
Nietzsche certa vez disse que ser filósofo é viver só em uma alta montanha
gelada. Ser artista em nosso país, com o
compromisso de fazer algo de qualidade e com personalidade própria, não
seguindo uma tendência pop de se fazer arte, é viver como o filósofo da
afirmação acima? (Principalmente no caso de quem escreve poesia, que não é nada
popular, já que mesmo entre pessoas que leem não é difícil encontrar quem não
goste de poesia.) O título do seu livro, “Por Sobre As Cabeças”, é uma
referência a Nietzsche, de alguma forma?
Resposta (João
Andrade)
Grande
Noir, eu acredito em arte como transgressão, como provocação, como aquilo que
incomoda. Dessa forma, a arte pela qual dedico minha essência é essa em que o
filósofo fala e fere em sua obra. Sim, Por Sobre as Cabeças é uma referência à
Assim falou Zaratustra.
Pergunta
(Leocy Saraiva)
João,
você faz uma poesia carregada de dialogismo, (pra Bakhtin nenhum botar
defeito!). Os poetas com quem você dialoga em seus trabalhos são suas
referências? Eles te "ferem"?
Uma observação:
Aprendo muito, realmente, com a poesia de João... se trago hoje suas marcas
poéticas, como diz o Paulo, sinto-me
honrada e agradecida.
Resposta (João
Andrade)
Certamente,
minha poetisa favorita. Os poetas com os quais diálogo são os que mais me
feriram ao longo de minha existência.
Pergunta
(Thiago Gonzaga)
Nos
indique um poeta e uma poetisa potiguar que você goste.
Resposta (João
Andrade)
Amigo
Thiago, estou aprendendo literatura potiguar com vc. Eu gosto de Iracema
Macedo, Marise Castro, Maria Maria, Leocy e outros contemporâneos. Ainda não
resgatei nossos clássicos potiguares. Gostaria de que você nos indicasse.
Pergunta (Ivam
Pinheiro)
Amigo
João, quando na sua poesia as palavras exprimem o sentir do poeta João, e em
que momento a poesia expressa e reporta o ser personagem poetado?
Resposta (João
Andrade)
Amigo
Ivam, meu ser poetado sou eu. Eu sou um homo sapiens poeticus.(rs)
Comentário
(Ivam Pinheiro)
Amigo
João, digo que o estilo se triste ou alegre, feio ou bonito, na minha opinião é
inerente ao ser Poeta. De forma nenhuma este traço não desmerece a sua
belíssima e bem trabalhada estética poética.
Pergunta
(Paulo Caldas Neto)
João,
você não parece se prender a uma forma poética. Seu poema é livre. Mas, a
reinvenção das formas poéticas também está presente no seu trabalho. Gostaria
que você falasse mais a respeito do processo de criação nesse sentido.
Resposta (João
Andrade)
Paulo,
em poesia o como se diz é tão importante quanto o que se diz. A minha
preocupação é dizer alguma coisa que preste, da forma mais poética possível.
Certamente, é difícil aglutinar esses dois intentos. Não penso em estilo. Penso
em fazer arte com a palavra.
Comentário (Eliete
Marry)
João
Andrade, já te falei né...sou sua fã. E cada resposta tua aumenta meu encanto
por seu fazer poético. Eu só aprecio e analiso em silêncio! Nada desejo perguntar
por este espaço. Já te falei de minha admiração e respeito.
Para
mim, "você poeta o que em mim está preso!"
Pergunta (Eva
Potiguar)
João,
você disse algo que eu aguardava muito ouvir. "Não penso em estilo. Penso
em fazer arte com a palavra".
Sem
desmerecer o valor de algumas normas na literatura, você concorda que o poema
para dar conta de funções tão viscerais que ferem e ao mesmo tempo, elevam ou
transcendem desse humano sapiens de arte plurissensorial (tátil, olfativa,
visual, sonora etc.), solicita quebrar paradigmas normativos e conceituais?
Resposta (João
Andrade)
Sim,
minha amiga Eva, acredito. Creio que não exista poesia sem emoção, porém
colocar a emoção no papel ainda não é poesia. Quando digo que quero fazer arte
com a palavra, estou dizendo que quero transmitir algo utilizando todos os
recursos estéticos e literários possíveis, romper com alguns e se possível
criar outros. O que não quero é ficar engessado em um estilo e ter a
preocupação parnasiana de priorizar a forma em função do conteúdo. Não estou
dizendo que o parnasianismo se resume a isso, é só uma ilustração.
Pergunta (Eva
Potiguar)
Seria
a arte do complexo e incessante busca de equilibro?
Resposta (João
Andrade)
Para
alguns. Para outros, do desequilíbrio. Tenho uma fascinação maior pelo que
oscila.
Pergunta (Eva
Potiguar)
Nesse
sentido, poetizar seria como arte de desfazer a própria arte em algo novo que
não exclui a literatura e sua inerente necessidade Estética?
Resposta (João
Andrade)
Exatamente.
Pergunta
(Rejane Souza)
Sua
produção literária teve início desde que era estudante do curso de letras na
UFRN, nos anos 80. Qual a relação que você faz entre suas poesias daquela Folha
Poética produzida nos corredores do Centro Acadêmico de Letras, com a produção
que você faz hoje? O que amadureceu? O que mudou? Qual sua visão poética hoje,
em relação àquele período?
Resposta (João
Andrade)
Amiga
Rejane, creio que perdi a violência juvenil e ganhei a reflexão senil.
Certamente, as leituras ao longo do tempo e maturidade me repertoriaram com
novas preocupações. Posso dizer que hoje sou mais chato como pessoa e como
poeta. Eu gostava mais daquele João.
Pergunta
(Arlete Santos)
Olá,
João. Na sua opinião, o poeta para ser
um bom poeta, necessariamente tem que ler outros poetas?
Resposta (João
Andrade)
Não
necessariamente. Já vi excelentes poetas analfabetos. Creio, amiga Arlete, que
esse poeta seria ainda melhor se ele tivesse bebido na fonte cristalina de
grandes poetas.
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